Friday, July 31, 2009

Jorros rápidos sobre o uso do twitter e redes sociais


Jorro rápido sobre o uso do twitter


por Desobediente

Posto aqui um jorro de observeções a serem desenvolvidas melhor a qualquer tempo, disparadas por uma mensagem de Caia Fittipaldi, que circulou na lista [Enxame_Nomade] da Rede Universidade Nômade, e pela leitura do texto 52 fragmentos sobre o Twitter, de Fábio Fernandes, em http://andrelemos.info/404nOtF0und/404_72.htm

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Jorro rápido sobre o uso do twitter

por Leonardo Retamoso Palma

Com o twitter aprofundamos a apropriação/invenção de usos/dessacralização/cooperação/colaboração em rede. Nada está dado de uma vez por todas. Não somos nós que nos adequamos às características das ferramentas/tecnologias… para que sejam adotadas e investidas de alguma relevância necessitam, precisam estar à altura da inteligência distribuída. Não são as NTIC que explicam a escala de sua adoção, antes o contrário!
As características do twitter estão em grande sintonia com o que o Bifo, Franco Berardi, chama de comportamento pós-alfabético (não estou me referindo a “sem-alfabeto” ou “anti-alfabeto”!). Sugiro a urgente leitura de Generación Pos-Alfa: patologías e imaginarios en el semiocapitalismo, do Bifo, Franco Berardi, publicado pela Tinta Limón, em Buenos Aires, em 2007. (é possível uma leitura afirmativa do pós-alfabético de que o Bifo fala!!)

Mas não basta, é preciso se levar muito a sério o que o Eric A. Havelock diz no capítulo 9, “Os Gregos antes da escrita”, do seu A revolução da escrita na Grécia: e suas conseqüências culturais (Ed. UNESP, 1996). Digo, só com o esgotamento (algo que está em curso ainda, é certo, por isso envio o link para o texto de Michael Hardt http://tinyurl.com/maroek que serve de base para o que estou querendo dizer aqui!) da hegemonia do arco civilizatório alfabético (o imperativo da intermediação extrínseca, objetivista, incorporada fora de nós, etc. em qualquer relação/mediação) recuperamos em outro registro uma das dimensões básicas do pré-alfabético: pensamento só poder virar cultura em compartilhamentos no presente das circunstâncias, no estar juntos, no “dar voltas junt@s” (no caso, em rede), na necessária presença d@(s) outr@(s) em tempo-real (justamente a característica mais importante do twitter!) e na necessária atenção mútua (implicação do corpo, empatia, afetações/emocionalidade: estados e mudanças de estado instante-a-instante, momento-a-momento) [pouco vale vermos o que circulou no twitter de importante depois do acontecimento, da ocorrência e da ampliação colaborativa/cooperativa/afetiva do contexto/espaço relacional de tempo-real. Vale o seu uso na produção mesma do evento colaborativa e multitudinariamente, não a despeito das listas, blogs, sites, etc. mas entrelaçado aos demais!].

Hierarquizarmos as ferramentas/meios/tecnologias não é desejável: nos apropriemos de tudo que é expressão de nossa potência! Vale aqui lembrar de um pequeno livro de Giorgio Agamben: Profanações (Boitempo Editorial, 2008), onde a dessacralização é proposta como apropriação profanadora, invenção criativa de usos comuns, o desarmar o poder ali onde ele está assentado justamente na sacralização (na interdição do uso comum, no impedir os usos e deslocar e ler fora das relações constitutivas, abstraindo, etc.).

Avancemos, não só na discussão necessária e desejável sobre tudo isso, mas nas profanações e dessacralizações! Quando usamos o twitter para fazer circular o que está acontecendo, e não o que estamos fazendo no momento, fazemos rede, composição incontrolável, abrimos e dinamizamos circuitos infernais de comunicação e afetação/acionamento/ativação proliferante: multiplicidade irredutível e ingovernáveis, singularizações produtivas … nos descobrimos multitudinariamente … colocamos a arte do encontro na ordem do dia, do momento, do instante… alargando-os…

No texto de Micheal Hardt, onde ele fala do esgotamento da sociedade da organização do trabalho abstrato, na diluição da sociedade civil e dos “lugares especiais” (na verdade lembrei aqui de Virno!) eu deliro ao pensar desde o gesto básico radicalizado com a escrita: a possibilidade de observando o fazer humano, decodificá-lo, formalizá-lo, e incorporar fora do fazedor e do seu fazer o feito (mas também o procedimento, a gesto, a operação), algo que atravessa a história das técnicas, das tecnologias, das culturas, das ciências, etc., e que faz do seu esgotamento (à lá Deleuze!) algo que produzimos e do que somos expressão ao mesmo tempo: o virtual e o virtuosismo/performático em rede, com a mediação do computador mas quebrando a intermediação hierárquica, centralizada, privada/privatizadora/privadora (vide a crise da indústria da intermediação na música, na comunicação, etc.! vide a crise da representação política!) etc., algo que recupera dimensões do pré-alfabético no pós-alfabético em que vivemos, mas sem ponto de retorno: expressões proliferantes da potência relacional, comunicativa, conectiva, colaborativa… rede! Inteligência social em rede, General Intellect; nem tecnofilia nem tecnofobia: recomposição do fazer (vide: http://br.geocities.com/autoconvocad/gramatica_da_multidao.html), da relação fazer-fazedor-feito (John Holloway), etc. Vale aqui também lembrar de "Reflexão sobre o culto moderno dos deuses fe(i)tiches, de Bruno Latrour (Bauru, SP: EDUSC, 2002)!!!

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Jorro rápido sobre o uso do twitter II
Por Desobediente

Ativado ainda pela lista [Enxame_Nomade], algo mais…

Problemas sérios mesmo aqui são tanto tecnofilia (que se expressa na apologia da técnica e da tecnologia) quanto tecnofobia (que se expressa no medo da técnica e da tecnologia): fazem delas, técnica e tecnologia, sujeitos (transcendentes, abstratos) e não expressão da potência operacional e relacional humanas, corpóreas, sociais. Deslocam o foco e nossa capacidade de tornar pensável as lutas e o que efetivamente podemos fazer.

Para a discussão sobre “marca” e principalmente Branding (”o processo de estabelecer e gerenciar imagens, percepções e associações pelas quais o consumidor se relaciona com um produto ou empresa”, já citando…), remeto ao livro da Naomi Klein, No Logo: a tirania das marcas em um planeta vendido, que está disponível para baixar lá no Cooperação sem mando, no link: http://www.4shared.com/account/file/25358775/f0430b53/Sem_Logo_-_KLEIN_Naomi.html

Concordo, sim, está tão presente o tema “marca”, o tema “Branding”, o tema exploração capitalista d@s que adotam dimensões de uma marca e: “todos, em todos os casos e saibam disso ou não, estão trabalhando de graça para divulgar marcas“, nessa discussão “twitter”, “facebook”, etc.. Mas isso, principalmente, para quem aborda como dimensão prioritária a perspectiva das empresas corporativas, suas estratégias e operações, e muitas vezes compreendendo-as como (novamente isso vejo como um problema grave!) o sujeito e, por outro lado, resto-mundo como objeto vitimário.
Mas, está longe de ser o problema prioritário/central para quem pensa potência multitudinária e abertura para a crítica prática da realidade existente (um pouquinho mais complexa do que um mundo com um único sujeito medonho). Está longe de ser o prioritário para quem está fazendo a crítica prática das interdições ao uso comum. A dessacralização/profanação, ou melhor, o desarmar as práticas e dispositivos de poder não se faz respeitando os usos propostos, limitados e especiais, normalizados e normatizados, discriminados desde algum lugar hierárquico e central (a empresa corporativa! o dono da marca!) de seja lá o que for, mas pelo excesso operacional e relacional, pela apropriação comum, pela proliferação de usos, pelo desrespeito à ordem pretérita (lembrando sempre: a gênese de algo não esgota tudo o que pode e se pode desdobrar desse algo!) de um suposto criador, proprietário, titular, explorador autorizado, investidor, etc. A crítica prática afronta o medo paralisador e tudo que implique respeito afirmativo (apologético) ou negativo (demonização e não-apropriação/contaminação).

No twitter encontrei grandes e robust@s “escrevedores”, bons escritores e principalmente pensadores que passam pelo critério de “poder/saber escrever, no mínimo, 30 linhas (2.100 caracteres com espaços = uma lauda do antigo papel impresso = 30 linhas de 70 toques, pelo padrão da antiga lauda)” e bem mais que isso. E fazem de uma ferramenta expressão de potências operacionais e relacionais aptas a dar curso à critica prática (viva, irredutível) da realidade ora existente, sem culpa nem medo, multitudinariamente.

De minha experiência posso dizer, o twitter, a um tempo, cumpre funções de agregador dinâmico, filtro, e articulação de mobilizações e encontro com pares, mais dispositivo de contágio/disseminação, logo, passei a ganhar um tempo que me tem sido precioso.

Mas sigamos, porque um blog, uma rede social, uma lista, é o que produzimos nela/nele e a partir dela/dele, de modo constituinte. Tem suas possibilidades e seus limites, como qualquer expressão/deriva das potências expressivas de quem se implica nela/nele.

Sem culpa nem medo, adiante!

Abraços!

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Por sua relação com os dois esboços acima, recupero uma postagem mais antiga que fiz no TREZENTOS: O início de uma multidão

Território Independente: co-produção de uma rede social, potência de muit@s

A idéia básica é:

“Um espaço ainda não é suficiente para se ter um território. O que produz território é o que se faz com, e nos espaços. A vida que acontece e as expressividades mobilizadas, as práticas que se exercem fazem território(s)…”

As “redes sociais” proliferam na internet. No caso do Território Independente, a rede virtual é expressão das dinâmicas presenciais que lhe antecedem.

As ferramentas de interatividade e relacionamento são usadas e criativamente praticadas em profusão pelo mundo, e na produção de mundos, de singularidades, a partir do comum, do compartilhamento e da cooperação. Há distintas plataformas e muitos são os recursos disponíveis. A experimentação com tudo isso não deixa para menos.

Antes de a presença das ditas NTICs (Novas Tecnologias da Informação e da Comunicação) explicarem nosso tempo, são mais a expressão da vitalidade e da existência da inteligência distribuída nas redes sociais (virtuais e não só nas virtuais) que encontra nas características dos recursos e ferramentas as formas adequadas e os meios adequados à sua produtividade social. Ou seja, as ferramentas e recursos são criadas para seres com capacidade de usá-las. E são esses seres, que pelo uso e pela prática e experimentação, inventam novos usos criativos que dão suporte para desenvolvimentos intempestivos, inatuais, inéditos, aptos à difusão, à socialização, à adoção e incorporação sociais, à escala da inteligência distribuída e em produção. O uso intensivo e extensivo das ferramentas e recursos de relacionamento e interatividade são expressão direta da produtividade social existente, vigente e proliferante.


Território Independente

“As características principais são a decentralização e o compartilhamento…”

A rede social Território Independente é expressão direta de encontros presenciais para onde convergiram e estão convergindo uma multiplicidade de criadores, produtores, ativistas culturais, público interessado e apoiadores de distintas dinâmicas culturais vivas e produtivas, que atravessam hoje os espaços alternativos (ou não) da cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, Brasil.
Das conversas e encontros presenciais à experiência de co-produção da plataforma virtual, a configuração e auto-apresentação assume: “o coletivo pretende conceber e viabilizar eventos itinerantes englobando várias formas de criação e expressão cultural”.

A dinâmica é aberta e tem sido caracterizada pelo acolhimento. Cada nova ou novo integrante, desde o início, territorializa sua expressividade e criando laços de afinidades (fazendo amigos), compartilhando suas criações ou simplesmente suas preferências e gostos, singularizando o espaço virtual ao usar as ferramentas disponíveis, vai compondo e co-produzindo o território comum: encontro de todas as expressões, riqueza da diversidade e da proliferação de gestos e afetos.
Cria-se relações através da comunicação, da cooperação, da mobilização cultural, da produção, da invenção de modos de se estar juntos, das iniciativas e das proposições. Cria-se sociedade, relações sociais, potência para se fazer, potência para o fazer cultural (inseparável do fazer econômico, do fazer vida, do fazer mundos: ética-estética-política do comum enquanto inseparáveis e irredutíveis).

Um território independente é um experimento de práticas recombinantes. Faz-se possível onde há uma robusta inteligência distribuída e em produção intensa: intensidade aqui é uma palavra forte, expressão de composição e potencialização das singularidades, da mobilização de desejos e de práticas desejáveis, mobilização produtiva, composições intensivas.

Quatro trechos que estão citados no Território Independente, podem ser lembrados aqui (no caso do TREZENTOS, mais uma vez!):

["..., corporações estão assaltando o comum e transformando-o em propriedade privada. Um ponto central aqui é que o comum é destruído ou se torna menos produtivo quando feito privado (e também, eu acrescentaria, quando é feito público, ou seja, objeto de gerenciamento estatal). (...) Quando as linguagens se tornam privadas elas não podem mais comunicar; quando os códigos são privados se tornam menos produtivos; quando afetos são privados eles param de criar relações sociais." (Michael Hardt)]

["A 'deserotização' da vida cotidiana é o pior desastre que a humanidade pode conhecer...é que se perde a
empatia, a compreensão erótica do outro..." (Franco Berardi, Bifo)]

["A ação da multidão não é outra coisa que esta proliferação contínua de experiências vitais que têm em comum a negação da morte, a recusa radical e definitiva do que paralisa o processo da vida". (Antonio Negri)]

["Refiro-me à multidão de festa, à multidão de alegria, à multidão espontaneamente amorosa, embriagada apenas pelo prazer de se reunir por se reunir." (Gabriel Tarde)]

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